A negação árabe da superioridade do Ocidente
Ahmad Masood/Reuters
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Perceba como a recusa por parte do mundo árabe em reconhecer o mérito dos valores ocidentais na verdade prejudica os árabes e muçulmanos.

A maioria dos árabes e dos muçulmanos não admitem que a civilização ocidental é superior. Admitem que é tecnologicamente e materialmente avançada, mas negam que o Ocidente tenha alcançado qualquer superioridade ou avanço cultural e ético.

Há uma desconsideração, metade deliberada, metade incidental dos avanços políticos e legais, que são por vezes rejeitados ao se referirem às contradições que parecem debilitar a sua base. Isto é bastante claro quando ouvimos reconhecimentos das tremendas capacidades industriais ocidentais ao lado de descrições da sua decadência cultural e falta de disciplina moral.

A maioria das correntes e escolas de pensamento no mundo árabe concordam com este ponto, mesmo que difiram nas explicações, descrições e detalhes. Nenhum deles nunca se perguntou a si próprio: pode uma cultura decadente e moralmente indisciplinada ter providenciado as bases para as tremendas capacidades industriais?

Talvez por esta razão o tempo mostre que a atitude árabe-islâmica para com o Ocidente é errada nas suas perspetivas, justificações e conclusões. Esta atitude revela que a perspetiva árabe-islâmica (com as possíveis exceções da Malásia e Indonésia) continua presa a um passado que só poderia ser ressuscitado através de meios destrutivos.

Mas o seu erro é ainda mais perigoso que isso, porque exprime mais a impotência e exaustão de uma civilização do que qualquer coerente posição política, visão civilizacional ou alternativa de projeto civilizacional.

A maior prova da incoerência e injustiça desta visão é que se encontram Baathistas, Nasseristas, Sunitas, Xiitas, Cristãos, Salafistas, Irmandade Muçulmana, nacionalistas, esquerdistas todos em conjunto a ridicularizar o Ocidente, a sua incoerência ética e a desprezar os seus alcances políticos. Isto vem a um preço alto, porque não reflete um consenso real tanto quanto representa um oportunismo de substância política vazia e menor quantidade de probidade moral.

Esta atitude reúne figuras desesperadas como o Supremo líder do Irão Ali Khamenei, o líder do chamado Estado Islâmico do Iraque e da Síria (conhecido por ISIS) Abu Bakr al-Baghdadi, o Secretário-Geral do Hezbollah Hassan Nasrallah, o líder da al-Nusra Abu Muhammed al-Julani, Chefe do bloco da Mudança e da Reforma Michel Aoun e o Presidente Sírio Bashar al-Assad (que é incidentalmente também o Secretário-Geral do Partido Árabe Socialista Baath na Síria).

Ao lado deles há outras figuras que já deixaram este mundo, como Saddam Hussein, Hafez al-Assad, Abdel Nasser, Abd al-Karim Qasim, Abdul Salam Arif e muitos outros. São também acompanhados pelo Salafismo e os sheiks da Irmandade Muçulmana e sheiks de outras escolas de pensamento. Ultimamente o líder do Houthi, Abdel Malik al-Houthi juntou-se também à lista.

O que é impressionante – e significante – é que enquanto eles concordam com este oportunismo grosseiro, discordam em tudo o resto. Estão empenhados em combates brutais e sangrentos em campos de batalhas de guerras religiosas no Iraque e na Síria, a lutar com base num sectarismo que não têm vergonhas em declarar.

Considerem comigo este panorama que existe há mais de um século: líderes políticos, clérigos religiosos, intelectuais, jornalistas, pensadores religiosos, artistas e diferentes escolas de pensamento ridicularizam incansavelmente o Ocidente e minimizam a sua superioridade civilizacional sem oferecerem uma alternativa. Invés disso as suas visões geram sempre conflitos internos e guerras entre eles, ou justificações para guerras infinitas e batalhas. O que é estranho é que este aparente consenso de depreciação do Ocidente e dos seus feitos civilizacionais nunca apoiou o que eles chamam de “frente unida [Árabe-islâmica]” mas pelo contrário sempre levou a fissuras e desintegrações. Ironicamente, sempre aumenta os pretextos da guerra e a luta entre estas facões, que mesmo assim nunca se cansam da sua atitude superior. Quanto mais ridicularizam o Ocidente, mais as suas disputas e divisões aumentam. Quão estranho é, que quanto mais ridicularizam, mais os que ridicularizam causam lutas entre eles.

O que é que isto significa? Antes que responda, considere estes três pontos.

1. Na maioria dos países, a Primavera Árabe (que não se pode dizer que acabou) tornou-se num gélido e mortal Outono Árabe ou até Inverno.

Este desfecho pareceu a muitos uma ocasião para revisitar pensamentos conspiratórios sobre conspirações para dividir a região – como se o Médio Oriente fosse um prato de chocolate ou de fruta à espera de ser dividido pelo exterior. Foi Muammar Gaddafi parte da conspiração de dividir a Líbia? É Bashar al-Assad parte de uma atual conspiração para dividir a Síria? São Ali Abdullah Saleh e Abdullah al-Houthi parte de uma conspiração para dividir o Iémen? Não encontrará uma resposta para isto no meio de teoristas da conspiração. Não porque não há resposta, mas porque tal como aqueles que ridicularizam, eles estão preocupados em colocar a conspiração no Ocidente. A conspiração é reconfortante e liberta-os das dificuldades de análise, de dolorosa auto-reflexão e aceitação da responsabilidade.

2. As pessoas mais comprometidas e ruidosas na sua ridicularização, menosprezo e resistência ao Ocidente são as mais retrogradas politicamente, as mais sectárias e mais cruéis contra os Árabes e Muçulmanos – e, particularmente contra as pessoas a que eles próprios pertencem e governam.

Deixando o ISIS de lado por agora, visto que isso é um exemplo autoexplicativo. Há um exemplo mais antigo que o ISIS que é semelhante a ele e que traçou o caminho para a sua emergência, um exemplo destas qualidades de ridicularização do Ocidente, sectarismo e brutalidade em conjunto: o regime sírio.

Desde 1963, a característica que mais distinguiu o regime sírio foi a de combinar brutalidade com ridicularização do Ocidente, enquanto reivindicava que resistia ao Ocidente. Não é com supressa nenhuma que o atual Presidente da Síria tenha levado a Síria para a mais violenta Guerra Civil da sua história. Após a morte de 300.000 pessoas, e a deslocação de mais de metade da população síria, Bashar al-Assad tem o objetivo de reivindicar que está a combater o terrorismo.

No mesmo contexto, encontramos o Hezbollah – que é o defensor mais ruidoso da “resistência” – de ser o mais encharcado em sangue Árabe e Muçulmano no Líbano, Síria e Iraque, enquanto tenta fazer o mesmo no Barém e no Iémen. Quem é que está a tentar dividir a Síria neste caso? A Rússia? Os Americanos? A União Europeia? Arábia Saudita, Qatar e Turquia? Ou será o Irão e as milícias xiitas? Ou a liderança do regime sírio e os seus aliados domésticos e estrangeiros?

3. A grande maioria dos migrantes Árabes que fogem das guerras civis árabes não vão para outros países árabes ou para o Irão.

Pode imaginar refugiados sírios a irem para o Irão, especialmente quando a maior parte deles são sunitas, não xiitas? Do mesmo modo, consegue imaginar refugiados xiitas do Iraque ou os alauitas da Síria a irem para a Jordânia ou para a Arábia Saudita? Quando alguns refugiados foram para a Jordânia e para o Líbano, foi um exemplo de receção hostil, más casas e falta de serviços, ao mesmo tempo uma perda de dignidade e de direitos.

Isto, não obstante, o facto de os árabes falarem mais de “dignidade”, do que direitos, e apesar de o “Partido de Resistência” – dos quais os seus apoiantes encontraram umas generosas boas-vindas na Síria em 2006 – dominarem o Líbano. Vê a ironia (de acordo com a logica Árabe-islâmica de ridicularização do Ocidente) no facto de os refugiados sírios na Turquia, Europa e nos Estados Unidos estarem melhores?

Estes pontos mostram claramente que a ridicularização do Ocidente e o menosprezo da sua superioridade são uma fuga à realidade e uma autojustificação vergonhosa e desculpa para uma inabilidade em ter sucesso. É uma desculpa para a intolerância, obscurantismo religiosos e sectarismo e mais que tudo para autoritarismo. Com o tempo, a ridicularização e menosprezo tornou-se num mecanismo político e ideológico para reproduzir uma cultura ultrapassada e obsoleta que suporta o autoritarismo e incuba o cúmplice do autoritarismo: o sectarismo.

O que não é claro é como é que esta ridicularização do Ocidente e menosprezo da sua superioridade se tornou numa complexidade civilizacional que com o tempo se tornou um obstáculo insuperável para os próprios árabes.

Fonte: Al-Hayat

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