Turquia aumenta a repressão na véspera de negociações com a UE
Murad Sezer/Reuters
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Os aliados de Erdogan esperam que a escalada de repressão não prejudique os laços da Turquia com o bloco europeu.

As autoridades turcas estão a agravar a repressão sobre a oposição ao Presidente Recep Tayyip Erdogan - apesar dos possíveis riscos para as tentativas do país de se juntar à União Europeia.

Em dois dias as autoridades assumiram o controlo da empresa que possui um dos principais jornais do país e indicaram a possibilidade de retirar a imunidade parlamentar a proeminentes legisladores curdos. Estas medidas surgem na véspera das negociações desta segunda-feira entre a Turquia e a União Europeia - que visam encontrar soluções para o fluxo de refugiados da Síria.

Com a UE a procurar ajudar ativamente a Turquia a conter a pior crise de refugiados da Europa desde a Segunda Guerra Mundial e as negociações sobre a adesão de Ancara numa fase inicial, os aliados de Erdogan esperam que a escalada de repressão não prejudique os laços da Turquia com o bloco europeu.

O Presidente espera que os líderes da UE "fechem os olhos" em troca da sua "cooperação na contenção do fluxo de refugiados sírios para o continente" - Avançou Aykan Erdemir, membro da Fundação para Defesa das Democracias, um instituto baseado em Washington e focado na segurança nacional.

Estado paralelo

Na sexta-feira passada, a Turquia assumiu o controlo do jornal Zaman - a última reviravolta numa campanha contra Fethullah Gulen, um antigo aliado de Erdogan acusado de liderar um "estado paralelo" para abalar o governo. A medida provocou confrontos entre a polícia e manifestantes anti-governo.

Os governos da UE reanimaram as negociações de adesão, dormentes desde novembro de 2013, como parte de um pacote de estímulos económicos e políticos para encorajar Erdogan a aceitar refugiados na Turquia em vez de os enviar para a Europa. O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, avançou - numa entrevista realizada na semana passada e transmitida no domingo na BBC - que "levará algum tempo até que possamos atingir o final das negociações com a Turquia sobre a adesão à União Europeia."

"Na verdade, o governo alemão tem grandes dúvidas sobre se a Turquia deverá ser um membro pleno da União Europeia - mas é uma questão para os próximos anos," disse Schaeuble. "Não é uma preocupação do momento."

Crítico feroz

O primeiro-ministro da Turquia, Ahmet Davutoglu, negou que o seu governo tenha interferido na designação judiciária relativa ao jornal Zaman, outrora apoiante de Erdogan e atualmente um dos seus críticos mais duros. No entanto, apesar de ter afirmado que "ninguém deveria questionar a liberdade de imprensa na Turquia," avançou à televisão AHaber, numa entrevista no domingo, que "devemos fazer uma distinção entre a atividade de imprensa e a atividade contra o governo eleito, por parte do estado paralelo."

"Vamos continuar a lutar contra os membros do estado paralelo - onde quer que estejam no estado," disse.

Separadamente, o primeiro-ministro avançou que o parlamento, dominado pelo seu partido AKP, irá votar em breve sobre a necessidade de retirar imunidade a certos legisladores do partido HDP, pró-curdo, para investigar supostas ligações ao grupo curdo PKK.

O partido curdo garantiu votos suficientes para entrar na legislatura pela primeira vez no ano passado - impedindo que o partido no governo detivesse lugares suficientes para rever a constituição e para dar mais poderes a Erdogan.

Não muito significativo

Erdogan sabe que a "União Europeia não pode impedi-lo de eliminar os seguidores de Gulen ou de levar legisladores curdos a tribunal por ligações com o PKK." - Avançou ao telefone no domingo Nihat Ali Ozcan da Fundação de Investigação em Política Económica em Ancara.

"O criticismo da UE face às políticas de Erdogan não é significativo numa época em que a tentativa de adesão do país não está no topo da agenda - e a confiança da UE na Turquia para lidar com a crise dos refugiados e proteger a Europa contra o terrorismo oferece mais espaço a Erdogan para seguir a sua própria agenda na Turquia."

Em resposta à tomada do jornal a UE avançou que a Turquia "Deve respeitar e promover altos padrões e práticas democráticas, incluindo a liberdade de imprensa."

Constituição suspensa

Na semana passada, os administradores designados pelo governo turco abalaram os meios de comunicação que pertencem ao grupo Koza-Ipek, outra campanha ligada a Gulen. O jornal Zaman foi lançado no sábado com a primeira página preta e o título "Constituição suspensa".

Sob uma nova gestão, o Zaman tornou-se um jornal pró-governo do dia para a noite, com a primeira página decorada com fotos de Erdogan e Davutoglu.

"Momento histórico!" diz o título, referindo-se à quase-conclusão de uma ponte sobre o Bósforo. Foram deslocados guardas armados para a sede do jornal em Istambul para prevenir novos confrontos.

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