Presidência dos EUA: por que razão não existe um candidato independente?
Patrick T. Fallon/Reuters
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O sistema eleitoral norte-americano tem tornado difícil a entrada de uma terceira alternativa

Antes da nomeação republicana se ter “fechado” ao redor de um amador populista com uma campanha xenófoba era evidente que o sistema político norte-americano se encontrava em crise.

Os comentadores tendem a concentrar-se nos baixos níveis de favorecimento dos presumíveis nomeados dos dois partidos. No entanto, nenhum dos dois principais partidos é visto de forma favorável pela maioria do eleitorado e um quarto dos eleitores norte-americanos tem uma visão desfavorável quanto a ambos os partidos. Além disso, uma sondagem da Gallup concluiu que 50% - 60% do eleitorado norte-americano apoia a necessidade de um terceiro partido na medida em que os partidos Republicano e Democrata “fazem um mau trabalho” a representar a população norte-americana. No entanto, o sistema eleitoral continua a rejeitar outros candidatos.

O sistema de dois partidos nos EUA foi moldado por forças históricas entre o início e meados do século XIX. O Partido Democrata, fundado em 1828, e o partido Republicano, fundado em 1854, não estão a dar – nos dias de hoje – as respostas que os norte-americanos merecem. Como resultado, há mais eleitores a identificarem-se como independentes do que como democratas ou republicanos.

Este sistema antiquado tem resistido à mudança por diversas razões. O sistema eleitoral norte-americano, que escolhe vencedores pelo voto maioritário em competições individuais, torna difícil a entrada de terceiras alternativas pois os eleitores temem perder o seu voto para um candidato que se venha a mostrar “saqueador”. Além disso, os prazos para apresentação de candidaturas tornam quase impossível que um candidato independente se apresente “tarde” no jogo – e o sistema de financiamento de campanhas confere enormes vantagens aos dois partidos estabelecidos.

Estas regras são difíceis de mudar pois as reformas teriam de ser promulgadas pelo Congresso ou pelas legislaturas estaduais quase totalmente controladas pelos dois maiores partidos – que seriam desafiados pela reforma eleitoral. Em cerca de metade dos estados, os eleitores podem apresentar uma iniciativa pela alteração das regras – mas trata-se de um caminho difícil e caro.

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Um obstáculo, no entanto, seria fácil de ultrapassar: a regra de acesso ao debate presidencial formulada pela Comissão dos Debates Presidenciais – um grupo privado que delibera em segredo e é controlado por membros leais aos partidos Democrata e Republicano. Um candidato à Casa Branca que não possa participar nos três debates de outono não tem qualquer hipótese de vitória.

As regras da Comissão, que exige um nível médio de apoio de 15% antes dos debates, garantem que nenhum candidato não afiliado – e que não seja bilionário – se possa qualificar. Desde 1968, nenhum norte-americano que não tenha participado nas primárias democratas ou republicanas alcançou 15% nas sondagens de setembro. Ao abrigo desta regra (imposta após 1992) até mesmo Ross Petor teria sido excluído dos debates de 1992.

Pouco antes do primeiro debate em outubro de 1992, as sondagens apresentavam 8% de intenção de voto em Perot. A sua presença no palco foi apenas permitida pois tanto a campanha de George H. W. Bush como de Bill Clinton determinaram ser do seu interesse tê-lo lá. Nas eleições, um mês depois, Perot recebeu 19% dos votos. O empresário do Texas tinha levantado a questão da redução do défice e, como os debates o tornaram um candidato viável, ambos os partidos viram-se forçados a responder. Os excedentes a nível federal no final dos anos 1990 devem bastante à presença de Perot em palco.

Com um terceiro candidato presidencial em 2016 seria menos provável ver os Democratas e Republicanos a serem conduzidos pelas visões mais extremas de ambos os partidos. Teriam de competir por votos ao centro e responder a questões do interesse de eleitores moderados. Mesmo que um terceiro candidato perdesse, o resultado seria outro: debates mais orientados para questões concretas, menos polarização, melhores perspetivas de governação e maior adesão de um eleitorado tendencialmente alienado.

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O sistema de exclusão do debate não estão sincronizado com as restantes democracias do mundo. O Reino Unido apresentou sete candidatos a primeiro-ministro nas suas eleições parlamentares em abril de 2015. No Canadá, no ano passado, quatro candidatos a primeiro-ministro debateram na primeira volta e três na segunda.

Três candidatos competiram nos recentes debates presidenciais em Taiwan. Nas suas últimas eleições presidenciais o Gana contou com quatro candidatos e o Brasil com sete, na primeira volta.

É uma vergonha que os EUA mantenham regras que excluem sumariamente uma terceira opção. A Comissão de Eleição Federal continua a defender a ficção de que a Comissão de Debates Presidenciais é uma organização apartidária. No entanto, ao longo do ano passado, a comissão – um duopólio bipartidário – rejeitou todas as solicitações de propostas de reforma, esgotando-se o tempo para este ciclo eleitoral.

Montar uma candidatura independente é caro e desgastante – e os independentes não se chegarão à frente sob regras que os condenam à irrelevância. Esta devia ser a última eleição presidencial em que os eleitores são privados da possibilidade de escolha mais ampla.

Fonte: Bloomberg

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