Estudos ao redor do comportamento financeiro sugerem que o amor ao dinheiro enfraquece a habilidade de investir
A avareza, o amor ao dinheiro, é um dos sete pecados mortais. Várias culturas espalhadas pelo mundo acreditam que a avareza é um mal a ser evitado.
Porém, existe também uma corrente intelectual que a considera boa para a economia. Para o pensador iluminista escocês David Hume, a paixão pelo dinheiro foi “a espora da indústria”, ajudando a orientar a “mão invisível” do mercado tal como concebida pelo conterrâneo Adam Smith.
Mais recentemente, o personagem de Michael Douglas, Gordon Gekko, no filme Wall Street (1987) declarou sem pudor que a “ganância é boa”.
As ideias contraditórias do clero e dos criadores do capitalismo liberal são explícitas o suficiente. Deus e Mamon entram frequentemente em conflito. Hoje em dia, porém, armados com as teorias do comportamento financeiro – que aplica psicologia comportamental às finanças – é possível escolher entre os dois. Mais, a pesquisa internacional recente, levada a cabo sob alçada do Centro de Investigação Aplicada da consultora State Street, sugere que ser ganancioso afinal não é nada bom. A avareza pode, na realidade, afetar a saúde.
A psicologia tem agora uma definição clara para o amor ao dinheiro. Não tem nada a ver com o precisar dele para concretizar um objetivo qualquer, que todos temos, mas antes com uma necessidade de ter dinheiro por si só.
A State Street desenvolveu a Investor Love of Money Scale (ILOMS ou a Escala de Amor ao Dinheiro do Investor) recorrendo à Money Ethic Scale (Escala Ética do Dinheiro) de Thomas Li-Ping Tang, de 1992. Os investigadores fizeram várias perguntas a entrevistados oriundos de 20 países, de modo a determinar o quão importante era o dinheiro para a sua autoestima. Foi-lhes igualmente pedido que considerassem uma série de cenários financeiros hipotéticos. Algumas das questões colocadas aos participantes foram, por exemplo, se o dinheiro é um símbolo de sucesso, se é tema de conversa corrente ou se aspiram a ser ricos.
Os resultados foram inequívocos. Quanto maior o apego ao dinheiro, maior a probabilidade de cometer erros. A pesquisa tem-se debruçado, nos últimos anos, sobre os estigmas comportamentais conducentes a erros da parte de investidores e a avareza parece agravar todos eles.
Os avaros têm tendência para comprar em alta e vender em baixa – o que, em matéria de investimento, é pecado capital. Também mostram horizontes temporais mais curtos e um comportamento hiperativo na hora de investir. Comprar e vender com frequência resulta numa despesa maior em taxas e é muito pouco provável que aumente o lucro.
Os amantes da riqueza tendem igualmente a pensar que podem deixar hábitos de poupança para mais tarde na vida – uma crença cada vez mais errada dado que títulos e obrigações com um lucro cada vez menor comprometem o rendimento na reforma. Consequentemente têm menor probabilidade de criar um plano de reforma e é pouco provável que invistam tanto como 6% do ordenado caso cheguem sequer a ter um. Daí que, ironia das ironias, pareçam estar no caminho certo para se tornarem um fardo para os congéneres mais prudentes.
Quem se preocupa menos com dinheiro tem mais apetência a adotar uma estratégia mais sadia e a contribuir frequentemente para vários planos de reforma de forma consistente. Tais planos implicam de facto abdicar de algum lucro e comprar quando os títulos estão em baixa. Posto em termos da gíria, mostram mais auto-controlo e inteligência emocional. Se a pesquisa ressalva uma mensagem indiscutível, é que os governos precisam efetivamente de incitar a população nesse sentido. Não dar às pessoas a opção de poupar, ou dar a opção de negociar em demasia, é uma receita para o desastre.
A avareza pode ser universal mas também difere muito em função do enquadramento económico. Países prósperos, onde a população tem menos razões para se preocupar com dinheiro, são menos mesquinhos. A Suíça e a Holanda receberam a classificação mais baixa na escala ILOM, com o Reino Unido – sem surpresa dado o constrangimento cultural em falar de finanças – pouco atrás. A lista é comandada por economias emergentes – China, Índia e Brasil.
Outro facto a considerar: apesar da riqueza, e do profundo carácter religioso da sociedade, os EUA estão perto do topo na liga dos avarentos.
O resultado é interessante mas não surpreende. A riqueza tem uma importância significativa para os americanos. Veja-se a campanha presidencial. Um dos poucos pontos em comum entre os dois candidatos: o calcanhar de Aquiles no que toca a dinheiro. Donald Trump tentou desesperadamente convencer toda a gente de que é rico e Hillary Clinton cometeu erros políticos crassos – como aceitar gordos honorários como oradora da Goldman Sachs enquanto preparava a candidatura – ao parecer querer e ansiar por mais dólares.
Ainda assim, os Estados Unidos criaram a economia capitalista mais bem sucedida do mundo. Talvez David Hume esteja certo. Note-se, contudo, o sucesso de Wall Street. A pesquisa da State Street sugere que, para lucrar com a avareza, deve dar-se às pessoas a oportunidade de negociar freneticamente, convencendo-as de que é dinheiro fácil. Wall Street assenta precisamente nessa premissa. Os que apontam o dedo ao maior centro financeiro mundial por lucrar com a ganância têm razão.
A avareza é, de facto, um ingrediente vital para o setor financeiro. O mercado por vezes comporta-se como se fosse eficiente. É através do comportamento irracional, a que muitos cedem, que se cria a possibilidade de fazer dinheiro. Aqueles que amam o dinheiro sem espírito crítico e em demasia, permitem que grandes investidores, capazes de controlar as próprias emoções e menos deslumbrados pela riqueza, possam fazer grandes fortunas.