Numa pequena ilha grega está a ser testada a adoção de uma moeda digital. Perceba como tudo funciona.
Com os bancos gregos a relatarem a preparação de planos de contingência para o potencial bail-in dos depositantes, à medida que cresce o medo de que a Grécia caminhe para um colapso económico, medidas urgentes precisam de ser encontradas. Poderá uma moeda paralela ser uma resposta e uma alternativa para a Grécia?
O mais recente desenvolvimento do bail-in, que aparentemente exige um corte de 30% dos depósitos bancários de mais de 8.000€, surge após o Fundo Monetário Internacional (FMI) ter alertado, na semana passada, que o pais necessita de mais de 60 mil milhões de dólares em fundos para estabilizar a economia ao longo dos próximos três anos, até ao final de 2018.
Alguns, como o antigo Primeiro Ministro grego e líder do partido Nova Democracia – Antonis Samaras – disseram que sair do euro e retornar ao dracma seria fatal para o país. Mas e uma moeda paralela, colocada lado-a-lado com a moeda única?
Lee Gibson-Grant, fundador da Coinstructors, consultora de moeda digital baseada no Reino Unido, e do projeto Drachmae, reuniu recentemente com o Presidente da Câmara de Agistri, uma ilha no Golfo de Salónica com cerca de 1000 habitantes. O Presidente da Câmara concordou em permitir o teste da tecnologia Blockchain para que as empresas locais possam criar um programa de fidelização (através do site Drachmaeconnect.com) que permita aos turistas reservar hotéis e outros serviços com descontos.
Apesar de Agistri ser apenas um estudo de caso este sistema poderá, contudo, ser aplicado a toda a Grécia: Gibson-Grant sugeriu a ideia de uma moeda digital paralela para a nação. Diz:
“Uma moeda digital através da Blockchain seria ideal agora para a Grécia e para os turistas.”
Com o país a ter atraído um recorde de mais de 20 milhões de visitantes estrangeiros no ano passado, e com este fluxo a contribuir para 18% do PIB da nação, as apostas são altas.
O assunto tornou-se ainda mais premente na medida em que a caixa multibanco de Agistri ficou sem dinheiro há uma semana. Na verdade, Gibson-Grant, que passou os últimos meses na Grécia, foi forçado a apanhar um ferry de Agistri para Atenas e a esperar em filas para levantar dinheiro de quatro caixas eletrónicas diferentes. Acrescenta:
“Eu sugiro à indústria do turismo grego que estudem os experienciados e testados benefícios da M-Pesa, um serviço de transferência de dinheiro e de micro financiamento através do telemóvel, e que criem uma rede que apoie uma moeda apoiada por ativos.”
A moeda poderia ser apoiada por ouro, prata ou um conjunto de ativos.
Poderia ser adotada por empresas locais na medida em que são fornecedoras de serviços a turistas – que poderiam comprar fichas digitais, aceites como reserva de valor. Fazê-lo poderá contornar o caos que circunda os bancos da Grécia. E enquanto o governo sublinhou que os turistas estão isentos de limite para levantamentos em dinheiro, as taxas cobradas são exorbitantes para todos os padrões.
Relativamente à aplicação da M-Pesa a outros territórios: a M-Pesa no Quénia encara cerca de 2 mil milhões de dólares de transações por mês e o país tem 40.000 pontos de localização (dinheiro que entra e sai). A M-Pesa representa 25% do PIB do Quénia e cerca de 10% das transações são de dinheiro em espécie que entra e sai. Prova, assim, o ponto em como o dinheiro digital pode ser utilizado numa base diária, além de como reserva de valor.
Outros Serviços de Tecnologia Virtual são utilizados noutros lugares como na Namíbia, onde a plataforma híbrida Blockchain é utilizada para serviços de dinheiro através da tecnologia NXT 2.0 da Blockchain.
Uma moeda paralela também oferece aquilo que Gibson-Grant descreve como “uma forma única de aproveitar a riqueza do país e ao mesmo tempo permanecer dentro das obrigações legais que a adesão ao Euro implica.” Na sua missão a Agistri procurou delinear os contornos da solução Blockchain para a Grécia.
A moeda digital poderia ser baseada nos consideráveis ativos, em termos de infraestruturas, existentes na Grécia – e que se estima estarem classificados em 17º lugar na UE. Ao monetizar esses ativos numa ficha digital o governo poderia pagar a pensionistas e funcionários públicos através da contabilidade digital da Blockchain, que oferece um método transparente para monitorizar pagamentos.
Alega que Agistri é “a terra perfeita para testar” uma nova tecnologia que utilize NXT 2.0 Blockchain e a funcionalidade de SuperNET para fornecer ao mercado internacional um ecossistema híbrido e uma ferramenta de marketing. A esperança é que reforce o turismo ao fornecer descontos a turistas que a utilizem e que “demonstre o que a tecnologia Blockchain pode fazer num cenário real.”
Neste ambiente de teste contido uma ficha de fidelidade (no valor de 1€ cada) pode ser utilizada por turistas que a obtenham através da subscrição da rede de negócios Drachmaeconnect.com. Podem ser obtidos descontos de até 90%, dependendo da vontade do proprietário. O Hotel Agistri e o restaurante e bar Yiannaand já se inscreveram.
Tal representa a primeira vez que o Blockchain é utilizada desta forma – mas continua por ser visto se os indivíduos irão adotar a tecnologia e beneficiar dos descontos oferecidos, criando um modelo que poderá ser utilizado a uma escala nacional. Um claro fator chave na determinação do seu sucesso passará pelo facto de as pessoas estarem dispostas a aceitá-la em troca de bens e serviços.
Poderá uma moeda paralela realmente funcionar de forma mais ampla na Grécia? E se sim, como? Gibson-Grant da Coinstructor diz: “Ao olhar para a atual situação da Grécia não vejo outra hipótese além da criação de uma moeda paralela para retirar a pressão de serem necessários planos de resgate financeiro. Mas a questão permanece: como? E seria em papel ou digital?”
E aqui surgem outros pontos que se poderão ponderar.
Papel ou digital? Quais as diferenças?
Mark Lennihan/AP Photo
O lançamento de uma moeda de papel paralela terá um custo significativo e levará tempo a imprimir – além da necessidade de alterar infraestruturas para bancos e comerciantes de acordo com taxas de câmbio. No entanto, se se considerar uma moeda digital a mesma demoraria muito menos tempo e será mais fácil de transferir para uma moeda existente.
Como Gibson-Grant explica: “Sendo um sistema digital a rede calcularia o câmbio para Euro, logo os comerciantes nem sequer precisariam de listar dois preços considerando que o mesmo será feito internamente e de forma automática.”
Uma moeda digital lançada pelo governo funcionaria?
Não seria valorizada na medida em que seria o mesmo que moeda de papel, apenas mais barata e fácil de transferir. Ainda assim será sempre um “vale”, não confiável pelos gregos ou pela comunidade internacional. No entanto, tem benefício na medida em que pode preencher buracos no sistema de pensões e fiscal.
Poderia uma Blockchain descentralizada fornecer algum valor?
Os maiores problemas que se têm ao lançar uma moeda paralela prendem-se com as questões ao redor do emissor – em quem consiste – e em quem realmente controla a contabilidade. Gibson-Grant assinala: “Se olharmos para a tecnologia Blockchain poderia ser a Bitcoin ou a tecnologia NXT 2.0 Blockchain, considerando que é descentralizada – criando assim uma moeda acima do controlo e interferência do governo.”
Adicionalmente todas as transações são públicas e totalmente transparentes, o que fornece ao público acesso ao que o governo faz com os seus recursos (ou seja, os impostos pagos pelos gregos ao seu governo, recorrendo a uma moeda paralela, poderão ser monitorizados através da contabilidade digital da Blockchain). Também fornece diretrizes para combater e mitigar a corrupção e fraude.
Embora tenha havido muita especulação em relação à Bitcoin e à forma como pode ser aplicada Gibson-Grant salienta que: “A população grega não pode comprar Bitcoin devido ao controlo de capitais, que os impede de obter dinheiro de fora do pais.” Além disso, existe apenas um câmbio de Bitcoin na Grécia passível de ser utilizado pelos serviços.
Uma moeda paralela para o turismo teria algum impacto para a Grécia?
Um sistema através do qual os turistas pudessem comprar uma moeda digital através de um cartão e depois vender qualquer coisa do que restasse sem perder dinheiro faz sentido considerando a atual situação – e também reduz o risco de andar com muito dinheiro.
Gibson-Grant diz: “O elemento central baseia-se na adoção e isto é resolvido utilizando o modelo de ponto de localização M-Pesa através do qual as empresas podem ser verificadas para aceitarem a moeda como pagamento – uma localização de entrada e saída de dinheiro onde os mesmos poderão ganhar 2% de taxa por fazê-lo, com a rede a cobrar 1% de taxa também.”
A taxa de 1% iria para a compra de mais ativos para manter o valor da moeda em crescimento, baseado nas transações realizadas. Assim, quanto mais for adotada e quanto maior for o número de transações mais trará crescimento económico para a capitalização de mercado da moeda e contribuirá para o aumento da confiança ao redor da moeda.
O elemento-chave passa por utilizar tecnologia Blockchain que tem funções essenciais e permite aos detentores de moeda votar nos ativos que querem adicionar ao carrinho. Segundo Gibson-Grant a tecnologia ideal é a NXT que é a primeira e única tecnologia, escrita a partir do zero, além da Bitcoin – com funções embutidas de votação para que tudo possa ser transparente e público.
Contudo, o resultado global de tudo isto é uma moeda apoiada por ativos, aceite como forma de pagamento de taxas e salários públicos. O problema de liquidez do governo será reduzido com a sua utilização.