Perceba porque é que apesar das quedas da bolsa, desvalorizações da moeda e explosões mortíferas o domínio da China é inevitável.
Quedas no mercado de ações, desvalorizações da moeda e explosões em armazéns dominaram as manchetes deste verão. Mas não se engane – este é o início da “Década Chinesa”, o momento em que a influência internacional do gigante emergente cruza um limiar crucial.
Os seguintes cinco factos explicam porque é que a ascensão da China é inevitável, mesmo com as recentes más notícias, e porque é que não durará para sempre.
1. Verão áspero
Os indicadores económicos têm apontado para uma desaceleração chinesa há já algum tempo – as exportações caíram 8% no mês passado, comparando ao mesmo período no ano passado – mas as preocupações vieram à tona nos últimos dois meses. Entre 12 de junho e 8 de julho o mercado de ações de Xangai caiu 32%. A 27 de julho o mercado de ações caiu 8.5%, a sua maior queda num único dia.
Para colocar em perspetiva: a “Terça-Feira Negra”, que conduziu à Grande Depressão, viu o Dow descer 12%. Julgava-se que os mercados sob o jugo de regimes autocráticos se encontravam imunes a essas oscilações selvagens – acontece que não.
A 11 de agosto o governo chinês desvalorizou o yuan renminbi para relançar a sua economia em desaceleração. Até ao final da semana o valor da moeda caiu 2.2%, a sua maior queda em 20 anos.
2. A Ascensão da China
Sim, o crescimento está a abrandar mas a níveis invejáveis para qualquer país desenvolvido. Entretanto, a marcha da China para número 1 continua. Em 2014, o PIB total da China superou o dos EUA quando medido em paridade de poder de compra. Utilizando esta métrica, a China corresponde a 16.32% do PIB mundial em 2014, superando os 16.14% dos EUA.
Mais impressionante do que a dimensão da economia da China é a velocidade a que cresceu. Em 2000 as importações e exportações chinesas corresponderam a 3% de todos os bens globais transacionados. Em 2014 esse número saltou para mais de 10%. Em 2006 os EUA eram o principal parceiro comercial de 127 países e a China era o maior parceiro comercial de apenas 70. Hoje, estes números inverteram-se: 124 países negoceiam mais com a China do que com os EUA.
3. A Resiliência da China
Apesar da recente turbulência a economia da China tem poder de permanência. Tal deve-se em parte ao facto de a liderança chinesa ter passado décadas a construir reservas de moeda estrangeira, hoje valorizadas em 3,7 biliões de dólares. Trata-se, de longe, do maior fundo do mundo para tempos menos fáceis.
Mais importante do que a proteção proporcionada pelo dinheiro é a consolidada liderança política da China sob Xi Jinping. O Presidente da China tem presidido a uma extensa campanha anti-corrupção – que já conduziu à abordagem de 414.000 funcionários e ao indiciar de 200.000.
No processo Xi reconstruiu, provavelmente, alguma da perdida credibilidade do partido junto da população chinesa. Tem definitivamente afastado atuais e potenciais adversários do seu programa de reforma – e da sua governação. A falta de reação ilustra o quão forte o seu controle político realmente é.
4. Espalhando riqueza (e influência)
Uma liderança consolidada permite também a Pequim prosseguir a sua abrangente estratégia global. A China passou as últimas duas décadas a investir taticamente em todo o mundo.
Os investimentos chineses em África saltaram de 7 mil milhões de dólares em 2008 para 26 mil milhões de dólares em 2013, ajudando o continente a construir estradas, caminhos de ferro e portos desesperadamente necessários.
Na América Latina, a China já se comprometeu a investir 250 mil milhões de dólares ao longo da próxima década, oferecendo a Pequim uma posição sólida no Ocidente. Tal irá estender a influência da China bem para além da Ásia, ajudando-a a assegurar o fornecimento a longo prazo das commodities de que necessita para continuar a alimentar a sua economia, a criar empregos para os seus trabalhadores e a abrir novos mercados para os seus excedentes de produtos industriais.
A China também pretende utilizar o seu dinheiro para remodelar a arquitetura financeira mundial. Para esse fim Pequim lançou o Banco Asiático de Investimento em Infraestruturas (AIIB na sigla inglesa) para rivalizar com o FMI e o Banco Mundial, sediados em Washington. Considerando que 57 países já se inscreveram como membros fundadores, alguns dos quais aliados dos EUA e que optaram por ignorar as objeções dos últimos, a organização encontra-se bem encaminhada. Com iniciativas como o AIIB a China irá continuar a financiar projetos de infraestruturas – e a construir aquiescência – para os próximos anos.
5. Problemas Adiante
Os desafios da China a longo prazo começam a ser impossíveis de ignorar. Estima-se que em 2050 a força de trabalho da China tenha encolhido em cerca de 17%. Acuse a demografia – em 1980 a idade média na China era de 22,1 anos; em 2013 de 35,4 e em 2050 será de 46,3. Uma força de trabalho envelhecida é como uma estrela desportiva envelhecida: ambas querem mais dinheiro e ambas estão longe de serem tão produtivas como foram antes.
A poluição continua a cobrar o seu preço – menos de 1% das 500 cidades chinesas atendem aos padrões de qualidade do ar da OMS. O Ministério do Ambiente da China admite que cerca de 2/3 da água subterrânea e 1/3 da água à superfície é “imprópria para consumo humano”.
Um novo estudo estimou que 4000 chineses morrem prematuramente a cada dia devido à poluição do ar. À medida que as massas se juntam a uma classe média crescente a liderança terá que lidar com forte exigência pública de água e ar limpos. Pequim terá que responder se quiser manter a paz e o seu regime intactos.
E o público terá os meios para tornar as suas exigências conhecidas: 650 milhões de chineses já se encontram online e a censura, apesar de sofisticada, não consegue controlar totalmente o fluxo de ideias e informação num mercado de redes sociais dessa dimensão – exemplo é a informação partilhada aquando da explosão em Tianjin. Os líderes chineses sabem que se devem preocupar com a opinião pública.
A crescente força da China ameaça a ordem mundial estabelecida mas as suas vulnerabilidades domésticas também terão repercussões globais. Ainda é muito cedo para dizer qual das duas será mais destabilizadora. De qualquer das formas, o mundo será moldado pelos sucessos e fracassos de Pequim. Bem-vindo à Década Chinesa.