Com a crise na China e as turbulências dos mercados globais, surge a questão sobre a possibilidade de a Índia, cujo ritmo do crescimento está maior que o da China, ocupar o seu lugar.
Nada resume melhor as contradições na Índia do que a estrada principal a sudeste de Deli para a cidade de Agra. Ao longo desta artéria principal que serpenteia para fora da capital está o novo metro de Deli - algo comparável ao metro de Londres (apesar de muito mais pequeno).Apesar dos residentes da cidade queixarem-se que está horrivelmente sobrelotado após uma década da primeira linha ter aberto, é contudo uma enorme demonstração de força infraestrututural. Todos os anos milhões de passageiros viajam para e da cidade nas suas seis linhas evitando o diário jogo dos famosos engarrafamentos de Deli.
E, tal como qualquer consultor de gestão lhe dirá, melhores ligações entre transportes podem ajudar a prosperidade económica de um país. Ao longo da brilhante linha de metro, a estrada principal para Agra é uma questão desleixada. Dentro de uns poucos quilómetros muda extremamente de uma escorregadia faixa com portagem, a uma auto-estrada transitável, a duas faixas de rodagem irregulares, a estrada com buracos e cobertas de entulho. Há, como é óbvio, o obrigatório boi a vaguear para contornar de vez em quando.
Rápido, rápido, devagar, devagar. A economia indiana em forma física.
Perturbações?
É uma economia que necessita de reforma e o Primeiro Ministro Narendra Modi insiste que ele é o homem para o fazer. E com a China a tropeçar e com os mercados globais preocupados que o motor do crescimento asiático possa estar numa “aterragem bruta”, pode a Índia, agora a crescer mais que a China, agarrar as rédeas? Honestamente, terá a força para acalmar as perturbações mundiais?
O senhor Modi efectuará uma visita oficial à Grã-Bretanha no Outono para vender o “sonho indiano”. Foi-me dito que ele imagina alugar o estádio do Wembley para um evento para celebrar as gerações de imigrantes indianos que fizeram do Reino Unido a sua casa. Se for em frente, será similiar à brilhante aparição no Madison Square Garden em Nova Iorque durante a visita aos Estados Unidos em 2014.
À parte do evento no estádio, muitos argumentam que - se o senhor Modi acertar com as reformas - o país que ele lidera pode economicamente dominar as próximas duas décadas tal como o crescimento da China dominou as últimas duas. Eleito o ano passado por uma margem de milhões de indianos cansados de décadas de conversa e pouca ação, o senhor Modi disse que estava na hora de dar um passo de mudança no caminho do crescimento.
Paralisados
Burocracia sufocante, projetos de infraestrutura presos em discussões infindáveis sobre quem realmente possui que parte dos terrenos, um parlamento devastado por políticas internas e um sistema de impostos frustrante na sua complexidade, são alguns dos problemas que o país enfrenta.
Após um ano da emocionante eleição, as queixas começaram - que o senhor Modi não está a mexer-se rápido demais, que as promessas permanecem isso mesmo - que os grandes planos para reformas sobre terrenos e mudanças nos impostos estão paralisados no parlamento ou até a andar para trás. A última sessão do parlamento - apropriadamente chamada de sessão monção (chove muito em Deli em Agosto) - passou precisamente zero peças de legislação reformatória apesar dos esforços do senhor Modi.
Um comentador, Gurcharan Das, o antigo diretor da Procter & Gamble na Índia, disse que o país ainda era um “lugar hostil ao negócio”. E se isso é verdade, o essencial investimento estrangeiro nunca fluirá.
Investimento estrangeiro?
Falei com o Ministro das Finanças, Arun Jaitley, um dos aliados mais fortes do senhor Modi, e perguntei-lhe pela sua resposta aos críticos que dizem que o governo tem desapontado.
“O governo tem a absoluta clareza sobre a direção que tem de seguir” disse. “O governo do Primeiro Ministro Modi quase todos os dias tem continuado a mudar e a reformar na direção correta e lentamente mas seguramente os resultados têm-se mostrado”.
A atividade bancária tem sido reformada de forma a permitir maior envolvimento do setor privado. O setor defensivo, de seguros e mobiliário têm-se aberto semelhantemente. Alguns procedimentos burocráticos foram simplificados e a ”facilitação ao negócio”, insiste o senhor Jaitley, está a melhorar. Admite, no entanto, que muita da mudança é ainda uma “obra em curso” e que as infraestruturas indianas ainda estão longe do ideal.
Para encorajar o tão necessário financiamento estrangeiro, o senhor Jaitley disse que ele irá “estender a passadeira vermelha” aos investidores estrangeiros.
Muitos olhares estão-se agora a virar para a Índia enquanto a China vacila. Será que o senhor Jaitley temeu que a Índia fosse varrida para a obscuridade global que surgiu esta semana, outra economia emergente que enfrenta tempos difíceis?
“Teve um impacto transitório” disse o senhor Jaitley sobre a turbulência do mercado de ações chinês e da decisão de permitir a desvalorização do renminbi. “Por exemplo, quando a economia chinesa abrandou um pouco não teve muito impacto. Quando a desvalorização e a “guerra” de moedas começou, fomos um pouco afetados negativamente. Quando os mercados globais caíram (nesta segunda-feira negra) sentimos também um forte impacto em termos de moeda e mercados. Mas no espaço de um dia tínhamos recuperado.
“Vejo isto como uma grande oportunidade. O “normal” chinês mudou. Já não é os 9%, 10%, 11% de porcentagem de crescimento”. “Então, o mundo precisa de outros motores para carregar o processo de crescimento. E num ambiente de abrandamento no mundo, uma economia que pode crescer 8-9% como a Índia, certamente tem ombros viáveis para suportar a economia global.”
“Oportunidade”
O chefe do JCB na India disse-me que como um importador líquido de petróleo e de outras matérias-primas, a Índia estava agora num ponto ideal. Enquanto economias emergentes como o Brasil ou a Russia passam por dificuldades, dependentes como são as suas economias de exportações de matérias-primas, a Índia está a ganhar com o ciclo deflacionário.
“Para nós, baixos os preços das matérias-primas e os baixos preços do petróleo são favoráveis” disse o senhor Jaitley. “É uma oportunidade e um desafio para a política indiana - se conseguirmos continuar a reformar a um passo mais rápido e realmente atrair investimento global, então a nossa habilidade em providenciar o ombro que a economia mundial necessita será ainda maior.”
O senhor Jaitley disse que o governo indiano já ganhou um lucro inesperado dos preços baixos do petróleo porque tinha reduzido a necessidade de subsídios públicos aos consumidores. Esse dinheiro, disse, será agora investido no desenvolvimento de infraestruturas.
A história do crescimento indiano importa, porque, de acordo com Christine Lagarde, a Diretora Geral do Fundo Monetário Internacional, a Índia tem o potencial de se tornar na terceira economia mundial na próxima década. De momento é a nona.
Com uma população de 1.3 trilhões que cresce a um ritmo mais rápido que a China, alguns estimam que o país terá o maior número de pessoas de classe média no mundo em 2020. E quanto maior a classe média, maior o nível de consumo, o que significa oportunidades para os exportadores da Grã-Bretanha e do mundo.
“O florescimento das classes médias cria enormes oportunidades”, disse-me Ambarish Mitra, o homem de negócios indiano que lançou o seu negócio de tecnologias, Blippar, no Reino Unido e que agora exporta de volta para a Índia. “O poder de compra da classe média está a crescer. Muitas pessoas já não saem mais da Índia porque muitas companhias mundiais estão a abrir lojas na Índia. No geral, o ciclo de consumo que faz uma economia mais rica tem todos os fatores criados [para a India]. Isso são ótimas notícias para a comunidade de negócios.”
História
E, mesmo que o governo se esforce por completar os projetos das infraestruturas ou reformar as leis dos impostos, o crescimento das tecnologias móveis pode começar a fazer alguma coisa do “peso pesado”.
“É um dos fatores mais importantes [no desenvolvimento da economia],” disse o senhor Mitra. “O verdadeiro empoderamento e distribuição de conhecimento nos nossos dias vem da conectividade, e a conectividade foi uma temática na última década. Agora, a conectividade de 3G e 4G está a mudar rapidamente o panorama.”
4G, disse ele, está em mais de 200 cidades da India. Muitas vezes é dito que a Índia vive vários séculos ao mesmo tempo. A hiper-moderna rede móvel, a era Vitoriana dos caminhos-de-ferro e, claro, o gado na estrada, uma lembrança do passado rural da Índia. O crescimento económico tem sido, por vezes, um desagradável companheiro para a história indiana e para as suas políticas estrondosas e agressivas.
O senhor Modi e o senhor Jaitley sabem que precisam de consenso se querem liderar um governo que aproveita a notável história do país, em vez de lutar contra ela.
E também podiam acabar a auto-estrada de Deli para Agra, ou pelo menos tapar alguns dos buracos.