Índia e Japão aproximam-se
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Os líderes da Índia e do Japão admiram-se mutuamente e ambos temem a China. A sua amizade irá ter efeitos sobre toda a Ásia.

Quando o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, começou a usar o twitter, o primeiro líder mundial que ele seguiu – e um dois poucos que ele ainda hoje segue – foi a sua contraparte indiana, Narendra Modi. Periodicamente os dois levam a cabo cortesias através da rede social.

Há muitas coisas que os juntam. Ambos são líderes nacionalistas de grandes democracias asiáticas, tendo cada um o seu lado negro. Abe faz ser duro de ouvido quando o assunto são as atrocidades que o Japão imperial cometeu na Segunda Guerra Mundial, enquanto Modi fecha os olhos ao fanatismo hindu de muitos dos seus seguidores. Ambos querem afirmar a grandeza dos seus países promovendo reformas que estimulam o crescimento e laços militares com Ocidente. Ambos cobiçam assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU, e apesar da China ser o maior parceiro comercial de ambos, ambos querem contrabalançar a ascensão militar desse país. Por isso, quando Abe se desloca à Índia para uma visita oficial de três dias que começou na passada sexta-feira, a questão é se os dois líderes conseguem passar de cortesias a compromisso.

  • O mais provável resultado concreto da visita é o acordo para que o Japão construa um comboio de alta velocidade para ligar duas das mais dinâmicas cidades indianas, Mumbai e Ahmedaba, a capital comercial do estado natal de Modi, Gujarat.
  • Mais há dois outros negócios potenciais que são mais significativos. Um é um acordo sobre cooperação nuclear-civil, que permitiria às empresas japonesas participarem em concursos públicos para a construção de centrais nucleares na Índia. O Japão vê-se a si próprio como um promotor do desarmamento nuclear, mas um acordo com a Índia daria o selo de aprovação japonês ao estatuto de potência nuclear da Índia.
  • O segundo negócio é um plano para o Japão construir hidroaviões para a Índia. Seria a primeira venda japonesa de material militar. Os aviões ShinMaywa US-2 são usados para vigia assim como para operações de busca e salvamento.

Abe alega que a parceria indo-japonesa é “relação bilateral mais importante do mundo”. Tal sou como demasiado elogioso. A relação mais importante tanto para Índia como para o Japão é a relação com os EUA, até para contrabalançar o poder chinês. Mesmo assim, o romance indo-japonês está certamente a florescer. Este ano o Japão juntou-se ao exercício naval anual do Malabar com a Índia e os EUA. A Austrália também quer passar a fazer o mesmo. Uma tentativa prévia de jogos de guerra no oceano Índico foi abandonada em 2008 depois de protestos da China.

A continuação de tais exercícios revela nervosismo regional acerca da China, particularmente devido à construção chinesa de bases militares nos recifes contestados no Mar do Sul da China. Sob Modi, a Índia declarou pela primeira vez interesse na liberdade de navegação no Mar do Sul da China. No ano passado o primeiro-ministro reclamou que “em toda a parte à nossa volta vemos uma mentalidade expansionista que lembra o século XVIII: cercar outros países, intrometer nas águas territoriais dos outros, invadir outros países e capturar o seu território”. Poucos duvidaram de que ele se referisse à China (e talvez também à Rússia).

“As aproximações geopolíticas entre a Índia e o Japão têm sido muito significativas,” diz Ashley Tellis, um ex-diplomata americano que está agora na Fundação Carnegie para a Paz Internacional, um think-tank em Washington. Dito isto, a tradição indiana de não alinhamento e a tradição japonesa de pacifismo ainda se fazem sentir. Os funcionários de Deli são firmes na posição de que o país não se deve juntar a nenhuma aliança formal.

“Podemos negociar com todos, mas não seguimos ninguém”, diz um.

Nem a Índia nem o Japão esperam ir em socorro do outro caso se concretize uma ameaça real chinesa. Mesmo assim, Tellis argumenta que uma cooperação mais próxima entre esses dois países cria incerteza para a China. As suas operações futuras poderão ser altamente condicionadas se, por exemplo, a Índia e o Japão partilharem informações sobre os movimentos dos barcos chineses em torno do estreito de Malaca.

Um amor que tem limites

A relação indo-japonesa não é perturbada por disputas territoriais ou ressentimento histórico. Durante a segunda guerra mundial o Japão foi parado antes de ter oportunidade de invadir o subcontinente indiano. Entretanto, muitos indianos ainda admiram o Japão por ter oferecido abrigo a combatentes pela independência da Índia, notavelmente Subhas Chandra Bose. Mais tarde, é verdade, o Japão e a Índia distanciaram-se durante a Guerra Fria. E depois de a Índia ter detonado uma bomba nuclear em 1988 o Japão suspendeu uma grande parte da sua ajuda, mas agora tudo isso é quase esquecido.

Se o não-alinhamento da Índia dantes significou uma inclinação em relação à União Soviética, o seu alinhamento de hoje é construído com base numa parceria cada vez mais forte com os EUA. Em 2005 os EUA assinaram com a Índia um acordo de cooperação nuclear-civil que, de facto, admitia a Índia ao clube de potências nucleares mesmo apesar de o país não ter assinado o Tratado de Não Proliferação Nuclear de 1968. Na sequência disso, os laços indo-japoneses estreitaram-se.

As ligações económicas entre a Índia e o Japão, por contraste, são ainda surpreendentemente escassas. Apesar da Índia ser a sétima maior economia do mundo, representa não mais do que cerca de 1% das importações, exportações e investimento direto no estrangeiro. Índia não acompanhou as décadas de explosão fabril na Ásia oriental. Mantém-se fora do Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico e Parceria Trans-Pacífico, um acordo de comércio livre que os EUA, o Japão e dez outros países acabam de concluir.

Mesmo assim, há muito potencial de sinergia: o Japão tem capacidade e capital, enquanto a Índia tem um vasto mercado por explorar e muito âmbito para expandir as manufaturas. As empresas japonesas, porém, permanecem frustradas com a burocracia indiana e as barreiras ao comércio. Apesar dos riscos políticos, muitas empresas japonesas ainda acham a China mais atrativa, diz Tsuneo Watanabe, da Fundação Tóquio, um think-tank. O comboio de alta velocidade, por exemplo, poderá enfrentar uma série de dificuldades com as ultrapassadas leis de aquisição de terreno da Índia.

O acordo de cooperação nuclear, entretanto, é aguardado porque alguns japoneses estão reticentes em relação ao mesmo. A Índia afirmou que não irá dar ao Japão mais garantias sobre o seu programa nuclear do que aquelas que deu aos EUA e ao Grupo dos Fornecedores Nucleares (do qual o Japão é um membro). Em relação às exigências japonesas de que a Índia assine o Tratado Compreensivo de Proibição de Testes, a Índia afirma que só responde perante a sua moratória voluntária de testes nucleares. A indústria nuclear japonesa, sob pressão depois do desastre de Fukushima em 2011, está porém ansiosa por um acordo. A conclusão do mesmo também iria ajudar as empresas de energia nuclear norte-americanas, que trabalham juntamente com as suas contrapartes japonesas.

Em relação aos hidroaviões, essa é uma prioridade militar questionável, mas representa um paço em direção à cooperação entre as indústrias de defesa de ambos os países. Alguns suspeitam que o negócio dos hidroaviões esteja dependente da resolução da questão nuclear. No futuro o Japão também espera vender à Índia submarinos convencionais. Durante a visita, os dois primeiros-ministros viajaram até Varanasi (dantes chamada Benares), o círculo eleitoral pelo qual Modi foi eleito para o parlamento. Um centro do Hinduísmo, Varanasi é também próxima do local lendário de nascimento do Budismo, que se espalhou através da Ásia até ao Japão (a cidade é geminada com Quioto, rica em património budista).

Mas o plano ambicioso de Modi para limpar o sujo rio Ganges, com a ajuda do Japão e outros países, fez até agora poucos progressos. Tal como o rio sagrado, a Índia move-se devagar.

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