Esclarecemos 14 dúvidas frequentes em relação ao vinho, para que possa apreciar melhor a requintada bebida.
Verdade seja dita, existe muita ciência por detrás de um vinho. A genética, a química, a microbiologia e até a psicologia, todas têm um papel em tudo, desde a produção do vinho até aos que escolhemos e quando. Com o intuito de obter uma melhor compreensão sobre o que está por detrás da produção de um copo de vinho tinto ou branco, conversámos com James Habertson, um professor de enologia – o estudo do vinho – da Universidade de Washington.
O vinho barato é mau para a saúde?
Nada disso. No ano passado começaram a circular rumores da existência de uma ação judicial que declarava que os vinhos baratos tinham elevados níveis de arsénico. No entanto, houve um pormenor que escapou aos rumores: essa ação estava a comparar os níveis de arsénico do vinho aos da água. Para ficar qualquer tipo de má experiência por causa disso, era preciso beber cerca de dois litros de vinho – um pouco mais do que 13 porções de vinho. É muito vinho!
Existe alguma diferença entre um vinho que custe $50 e um que custe $500?
A resposta é “não muita” – contanto que só queira vinhos para beber. O preço é ditado por uma série de fatores – a fabricante, o tipo de uva, o tempo de maturação, etc. Contudo, se o que procura é uma simples garrafa de vinho, uma mais acessível pode fazer as mesmas delícias, se não mais, que uma garrafa de mil dólares.
O que existe é um grande componente psicológico. Um estudo em que se realizou uma prova de vinhos em que os participantes estavam vendados e lhes era dado amostras de vinho, revelou que o prazer não diferia entre uma garrafa de vinho caro e uma garrafa de vinho mais barato. Noutro estudo que se realizou com provadores de vinho inexperientes, os investigadores descobriram que por acaso, os participantes tinham tendência para gostar mais dos vinhos caros do que dos baratos. Agora, se for um colecionador, obviamente que o valor fará a diferença.
“No final de contas, é tudo vinho”, disse Harbertson.
O que são os taninos e o que fazem no vinho?
Está a ver aquela sensação seca que fica na boca quando bebe um gole de vinho tinto? É obra dos taninos, químicos de ocorrência natural que se encontram no vinho e noutras bebidas tal como o chá preto.
“Os taninos são o que conferem peso ao vinho – o que os torna mais leitosos do que a água – e são parte integrante de todos os vinhos tintos”, afirma Harbertson. Eles retêm as proteínas como as que se encontram na saliva, tornando a boca mais seca. “Não é uma experiência tão simples como provar algo amargo”, disse ele. A interação do vinho tinto na boca acaba por ser mais como uma espécie de textura do que apenas um sabor, algo conhecido como “sensação bucal”.
É mau eu gostar de um vinho que custe $3?
Não posso negar: agrada-me gastar apenas $3 numa garrafa de vinho Charles Shaw do Trader Joe’s. E Harbertson confirmou que não há qualquer problema. Aliás, até acha isso “fantástico”.
“Se gosta do vinho e este só lhe custa 3 dólares enquanto outra pessoa tem de pagar $30 pelo mesmo, isso significa que está à frente de um ótimo negócio”, referiu ele.
É como as pessoas que gostam de batatas fritas de marca branca. Algumas pessoas não as suportam, mas se você gosta, então está a poupar uns quantos dólares. Alguns estudos mostraram que saber que um aumento de custo está correlacionado com uma experiência de consumo mais agradável, já para não dizer que podem existir alguns cortes na qualidade ao fazer-se vinho a granel, se é do seu agrado, continue a consumi-lo.
Como é que distingo um vinho floral de um frutado? Esses adjetivos são assim tão importantes?
Os vinhos têm tendência para incluir vários tipos de notas aromáticas, que podem ser bastante aprazíveis se souber o que está a fazer. Eu, na parte que me toca, não sei.
Harbertson sugeriu a realização do seguinte exercício para apurar os seus sentidos na próxima vez que provar um copo de vinho:
- Pegue nuns sacos de drageias de vários sabores e divida-as em várias chávenas por sabores. Guarde-as por uns dias – ou horas, se estiver num momento decisivo – para que se esqueça um pouco deste processo.
- Mais tarde, retire as drageias e tente adivinhar o sabor de cada uma.
- Por fim, experimente provar várias de uma vez. Agora, tente adivinhar quais os sabores que lhe calhou. É mais ou menos assim que a prova de vinhos funciona: tenta-se decifrar os vários sabores e aromas, como o do morango, mesmo que não se esteja a comer nenhum.
Porque é que se dá tanta importância ao ato de se cheirar o vinho?
Parte do prazer de se beber vinho é o cheiro. Num único copo de vinho, podem existir vários cheiros frutados, florais ou de solos. E esses cheiros podem mudar conforme o tempo que o vinho é exposto ao ar livre. Um copo de vinho pode contar milhares de compostos químicos que estão prontos a reagir a qualquer momento.
“Existe toda uma série de reações químicas que mudam o aroma do vinho no copo”, disse Harbertson.
Grande parte disso está relacionado com o ar que entra em contacto com a superfície do vinho. Quando o oxigénio existente no ar se mistura com os compostos fenólicos do vinho, fá-lo oxidar – que, se acontecer cedo demais, pode estragar o vinho. Aquele magnífico sabor frutado pode transformar-se no copo em algo mais semelhante a frutos secos em poucas horas.
Qual a história por detrás dos levedos do vinho?
Os compostos químicos do vinho provavelmente devem a sua existência aos levedos, um fungo microscópico responsável por digerir o açúcar e produzir o álcool. Os levedos são adicionados ao vinho durante o processo de fermentação. Quando consome todo o açúcar da garrafa, acaba por morrer.
Um aspeto interessante apontado pelo departamento de botânica da Universidade do Havai, a pele das uvas já tem uma certa quantidade de levedos que podem ajudar na fermentação. Mas uma vez que o vinicultor não tem muita influência na forma como o levedo atua, acrescenta-se por vezes algumas variedades de levedos específicos para garantir um nível de controlo.
O que são os sulfitos e o que fazem no vinho?
Os sulfitos são um composto predominante na grande maioria dos vinhos. O enxofre e o oxigénio existentes no sulfito atuam como um conservante poderoso para impedir que o vinho se oxide cedo demais, o que pode alterar e estragar os sabores do vinho. “É muito difícil beber um vinho que não tenha sulfitos”, afirmou Harbertson.
Aliás, os levedos são responsáveis por alguns destes sulfitos. Harbertson explicou que por vezes, as várias colónias de levedos existentes no vinho lutam entre si, criando sulfitos aos quais algumas espécies de levedos são mais sensíveis. Algumas pessoas são alérgicas aos sulfitos – que também se podem encontrar noutros alimentos como conservantes do mesmo – por isso o melhor para essas pessoas é evitá-los.
O que é a decantação?
Está relacionada com o cheiro e os sólidos. As reações químicas no vinho podem criar partículas sólidas, especialmente em vinhos mais velhos – desde células de levedo mortas a proteínas e outros compostos orgânicos. Deixar o vinho num decantador durante algum tempo pode ajudar a garantir que essas partículas vão cair para o fundo da garrafa.
A decantação também pode ajudar a suavizar um aroma demasiado forte de um vinho.
Porque é que fechamos o vinho com rolhas de cortiça?
A cortiça, que é feita de casca de árvore, é um recurso renovável e a sua habilidade para se moldar conforme a forma da garrafa é bastante útil na hora de guardar os vinhos.
No entanto, tem uma desvantagem: por vezes, uma cortiça com pouca qualidade pode ir parar ao vinho, conferindo-lhe algo a que se costuma chamar “gosto a rolha”. Não é algo que lhe vá fazer mal, mas vai fazer o seu vinho ficar com um sabor um pouco estranho, parecido com cartão bolorento. Algumas pessoas não se importam em beber um vinho assim, mas outras − tal como Harbertson – simplesmente não suportam.
As tampas de atarraxar significam que o vinho é barato?
Não! Embora a falta de cortiça tenha o estigma de “vinho barato”, alguns países como a Nova Zelândia têm vindo a transitar para o estilo de caricas nos últimos anos, após terem-se chateado com a má cortiça. Não só se evita o “gosto a rolha” como também é o ideal para quando não se tem à disposição um saca-rolhas. Harbertson disse que tampas de atarraxar são tão eficazes a manter o vinho privado de ar como as de cortiça.
A genética tem alguma coisa a ver com o vinho que se gosta?
Sem dúvida! Os genes influenciam se preferimos um sabor mais doce, amargo, temperado, etc. E eles podem ter um papel muito importante na nossa seleção de vinhos.
Pensa-se que o TAS2R38, o gene recetor do sabor amargo, é responsável por tornar algumas pessoas incrivelmente sensíveis a sabores amargos enquanto outras parecem sempre querer mais. Outros genes de paladar, tal como os dos sabores temperados, também podem influenciar bastante na sua preferência por determinados tipos de vinho.
Porque é que por vezes fico com dores de cabeça mesmo que só tenha tomado um copo de vinho?
Segundo Harbertson, na maioria das vezes, isso tem mais a ver com a forma como bebe do que com o que está a beber. Quando o corpo deixa de consumir o álcool cria uma inflamação. Essa inflamação pode contribuir para a sua dor de cabeça. É essa a maior razão para a dor e não tanto os químicos do vinho. Harbertson sugere que comer e beber mais água enquanto consome vinho pode ajudar a neutralizar essa maldita dor de cabeça de manhã.
Existem alguns vinhos que devo evitar?
Harbertson não iria tão longe e dizer que existem vinhos que evitaria. Tudo depende dos seus gostos e especificações. No geral, não existem nenhuns vinhos em específico que o vão “envenenar” ou fazer mais mal do que qualquer outra bebida alcoólica. Na sua opinião, de facto costuma poupar nos vinhos baratos para coisas como a sangria, em que o vinho é misturado com outras frutas saborosas e refrigerantes.