É possível aprender idiomas com uma app?
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Recentemente muitas pessoas começaram a aprender idiomas estrangeiros com a aplicação Duolingo (incluindo o próprio Bill Gates), mas será a aplicação realmente eficiente?

Cerca de 70 milhões de pessoas, incluindo Bill Gates, registaram-se na app de aprendizagem de línguas Duolingo. A app recebeu enorme atenção da comunicação social, e os seus criadores afirmam que pode ajudar qualquer pessoa que tenha um smartphone a aprender uma nova língua. A aplicação é gratuita e promete todo o tipo de funcionalidades inovadoras, tal como algoritmos que se adaptam à velocidade de aprendizagem de cada utilizador e um elemento de "jogo" para aumentar a motivação. Os seus criadores afirmam também que esta app pode oferecer aos membros das comunidades mais pobres um acesso à aprendizagem que de outra forma lhes seria negado — o que é, de facto, uma proposta honorável. Enquanto experientes professores de línguas, quisemos perceber se esta tecnologia é ou não realmente inovadora.

A teoria da aprendizagem de línguas

A primeira instrução moderna de linguagem chamava-se "tradução de gramática"

Ela focava-se na tradução de frases e na aprendizagem das regras gramaticais. Este tipo de trajeto de aprendizagem permitiu a muitas pessoas aprenderem Latim — incluindo Brian da comédia dos Monty Python. É também o método utilizado pelos professores de várias gerações de turistas ingleses na França, que acabavam por saber conjugar um verbo mas eram incapazes de se fazerem compreender sem gritarem uma estranha forma de inglês com um sotaque francês.

Após a II Guerra Mundial, começou a reinar um método chamado "audiolingualismo"

Esta abordagem era parcialmente apoiada na ideia de que as recompensas positivas reforçam o comportamento, e que as regras e os padrões formam os sistemas primários da linguagem. O exercício — onde os estudantes repetem as frases uma e outra vez — tornou-se a principal atividade de aprendizagem. O exército americano afirma ter tido grande sucesso com uma forma de audiolingualismo, que ficou conhecido como o "método do exército". Mas tem sido sugerido que a motivação era mais importante que o método, e que a motivação de um soldado é radicalmente diferente da motivação de uma criança na escola. No contexto da sala de aula, gerações de crianças sentaram-se em filas e entoaram frases gramaticalmente corretas, repetindo o que a professora dizia. Mas quando iam a França, estes alunos podiam dizer pouco mais que “la plume de ma tante est sur la table” ("a caneta da minha tia está na mesa"). Isto de certeza que não era útil num restaurante.

Ao longo das décadas de 1960 e 1970 começaram a surgir um número de novos métodos, frequentemente baseados numa filosofia holística e humanista

De uma perspetiva contemporânea, estes métodos vão desde a excêntrica "forma silenciosa" — onde o professor está proibido de falar — até à abordagem claramente charlatã da "sugestopédia", onde os professores e os estudantes são encorajados a ter uma relação de pais-filhos, lendo longos diálogos em voz alta e ao som de música. Alguns estudantes recusaram-se a ser analisados psicologicamente numa sala de aula, enquanto outros continuavam incapazes de pedir comida num restaurante.

A comunicação é a chave

Ao longo do tempo, muitas ideias confluíram naquilo a que é habitualmente conhecido como a "abordagem comunicativa". Esta etiqueta refere-se a métodos que dão prioridade à função da língua enquanto comunicação, e não à sua estrutura.

A ideia é a de que, se estamos a falar com alguém, é bom se a gramática estiver correta, mas também é aceitável caso contrário: é muito pior se a gramática estiver certa mas a nossa pronúncia for tão má que a outra pessoa não consegue compreender o que estamos a dizer. É também igualmente mau se estivermos tão preocupados em ter uma gramática completamente correta que ficamos hesitantes em participar numa conversa.

A beleza da abordagem da comunicação, ou o seu grande defeito, na opinião de alguns, é a sua habilidade, tal como a língua em si própria, de se adaptar e adotar novas ideias. Esta abordagem reúne ideias e técnicas de todos os períodos da história da aprendizagem de línguas, e todas elas são aceites desde que ajudem os estudantes a comunicar de forma eficaz.

A app não basta

Então, onde é que o Duolingo se encaixa neste contexto teórico? Bem, quando utilizamos a app para aprender o básico de italiano, por exemplo, temos exercícios repetidos como "Eu sou a criança" ou "Eu tenho uma taça". Este é um exercício de repetição ao género do "audiolinguismo", e não há qualquer comunicação envolvida. Em vez da comunicação básica, os utilizadores repetem um exercício uma e outra vez, com frases sem contexto e, efetivamente, sem significado.

Mas há duas coisas que nenhum teórico poderá negar acerca de aprender uma nova língua: a importância de aprender muitas palavras, e a necessidade de um esforço constante. E é aqui que uma app como o Duolingo realmente pode fazer a diferença — ela recorda os utilizadores a praticarem todos os dias, e reforça as palavras que já aprendemos enquanto nos encoraja com recompensas virtuais (se gostam desse tipo de coisas). Uma vez que o tempo necessário para isto é tão reduzido, estes exercícios podem ser completados enquanto se está na fila para o autocarro, permitindo que os utilizadores aprendam sem sacrificarem outras coisas das suas vidas.

Acreditamos que as aplicações como o Duolingo podem ser um suplemento útil para quando se está a aprender uma língua; mas não um substituto. A app pode ajudá-lo a aprender algumas palavras, e algumas construções básicas, mas não irá oferecer-lhe a oportunidade de entrar numa conversa numa nova língua. É melhor que nada, mas existem outras opções mais eficazes.

Mas talvez não estejamos a perceber... A língua representa uma poderosa "porta de entrada" em muitas sociedades. Falar a língua certa, da forma certa, oferece um enorme número de oportunidades. E por isso talvez não devêssemos estar a pensar se esta app vai ajudá-lo a desfrutar mais confortavelmente as suas próximas férias no estrangeiro.

Talvez os criadores tenham razão, e nós deveríamos estar a pensar se este tipo de aplicações pode oferecer oportunidades às pessoas que, de outra forma, não as teriam. E se estas apps podem ser utilizadas para combater problemas como a iliteracia global, então o objectivo dos seus criadores apenas poderá ser aplaudido.

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