O relógio biológico das empresas

As empresas tecnológicas movem-se nos sentidos do ponteiro do relógio, adequando as narrativas das empresas a um arco previsível. Veja como os profissionais lidam com isso.

Não me lembro de quem me disse que as narrativas das empresas eram como um relógio. Eu estava na Google, onde tinha aceite um trabalho na equipa de Comunicação. Durante os meus primeiros dias tentei navegar na minha nova profissão ao ouvir os diversos profissionais da Comunicação na empresa, com quem aprenderia bastante. Nunca mais me esqueci de uma teoria sobre narrativas:

Foi uma observação de passagem e dificilmente revolucionária – seguindo de perto a jornada do herói e outras teorias do storytelling. Mas fez bastante sentido.

Ao longo dos anos desenvolvi esta ideia ao preencher os tempos do relógio. Tem ajudado com a tecnologia. As start-ups, em particular, começam sempre com uma “história da fundação” e seguem um caminho típico através do Silicon Valley Time (SVT). Não é perfeito, claro. As empresas podem saltar uma hora – ou, em alguns casos, muitas horas. Outras ficam presas ao longo do caminho e deixam de ser relevantes – com uma narrativa parada (e relógio partido).

Saber o tempo geral de uma empresa tornou mais fácil para mim observar pormenores e fazer melhor o meu trabalho.

Se você já estiver a fazer notícia às 12:00 significa que provavelmente já foi bem sucedido antes – pois a mera criação da sua empresa é de pouco interesse. Se você estiver na imprensa tão cedo por qualquer outra razão a probabilidade é que não seja bom.

Se você for realmente mau, uma única vez, você poderá percorrer todo o relógio com um único movimento. Isto normalmente requer um lançamento que aliena todos com uma mistura de presunção e “poder de estrela”, exacerbada pela quantidade de dinheiro arrecadado ou um excesso de confiança nas relações públicas.

O meu exemplo preferido para isto é a Color, uma aplicação de fotografias que arrecadou 41 milhões de dólares em março de 2011 e passou de amada a odiada em 24 horas. Nunca recuperou.

É por volta da 1:00 que o primeiro artigo sobre a sua empresa é escrito. Com os conhecimentos certos qualquer um poderá fazê-lo até à 1:00. Você lançou o seu produto, recebeu dinheiro de alguns investidores proeminentes e a sua aplicação dá uma boa manchete. As pessoas ainda não sentem algo forte em relação a si, de uma forma ou de outra, mas agora ouviram falar de si e isso é importante.

Hoje, muitas empresas 1:00 são a “Uber” para qualquer coisa, como para pintar a casa. A Reserve, a Uber para os restaurantes, encontra-se atualmente na 1:00.

Chegar às 2:00 é uma verdadeira realização – muitas start-ups não chegam tão longe. Às 2:00 você observa tração real. Ainda não atingiu a velocidade de escape mas o momento é excitante – e você pode percebê-lo no Twitter e na crescente cobertura tecnológica que recebe. A Buzzfeed, Re/Code e The Verge são acompanhadas por métricas de vaidade. As empresas maiores começam a perguntar:

Bem-sucedida na SXSW no início deste ano a Meerkat alcançou as 2:00. Daí o Periscope.

Nem todas as empresas passam tempo nas 3:00 horas. Muitas desaparecem pouco depois da descolagem. Outras saltam para uma hora mais tarde. Mas as coisas tornam-se interessantes às 3:00. Mais importante: a imprensa de negócios dominante (New York Times, Bloomberg, Wall Street Journal) começa a prestar atenção. Dá credibilidade à sua história, mostrando o seu todo.

O Airbnb, Square e Uber são exemplos de empresas que passaram pelas 3:00. Em cada caso o produto inicial era interessante – arrende o quarto livre em sua casa (ou durma no sofá de alguém); aceite um cartão de crédito no seu telemóvel; chame um carro preto. Mas à medida que foram crescendo tornou-se claro o grande potencial destas empresas – se por mais nada, por “rutura”. Para o Airbnb isso significou subverter a indústria da hospitalidade; para a Square, aumentar o acesso a serviços financeiros; e para Uber, ultrapassar o mercado dos táxis e mudar a natureza dos transportes. As empresas das 3:00 são um grupo diverso.

Zenefits, que a Forbes descreve como “a interromper uma indústria indigesta de que a maioria das pessoas nunca ouviu falar: recursos humanos para pequenas empresas”, está com bom aspeto às 3:00.

Às 4:00, o negócio (e os media) impulsionam o recrutamento. Toda a gente quer trabalhar para a próxima grande empresa, o que torna a sua empresa a mais atraente do Valley. O seu pseudónimo está em destaque na imprensa e você está afogado em oportunidades. Por isso você faz tudo: perfis dos fundadores, gráficos hockey stick – você até chega a ser notícia quando nem sequer o está a tentar. Se você for um produto de consumo provavelmente já se encontra nos grandes shows matinais.

Hoje são 4:00 na Slack. Toda a gente adora a Slack.

Às 5:00 tudo é lucro. Você está a crescer depressa e a sua valorização está a subir rapidamente. Relatos de que você está a perder dinheiro? Se você estiver às 5:00 esses relatos são irrelevantes. A sua estratégia é inteligente, as suas projeções são sensatas e a execução bem-sucedida é inevitável. Você é um vencedor.

O Pinterest e o Airbnb estão a cruzar as 5:00.

No percurso de uma empresa o crescimento e o sucesso são seguidos por lutas e dúvidas. É por isso que, no topo da montanha, não há para onde ir além de para baixo.

Começa às 6:01. A partir daí será escolha-a-sua-própria-aventura-de-histórias-negativas. “Falha a inovar”. “Problemas de monetização”. “Êxodo de colaboradores”. As temidas “questões de privacidade”. A volta ao relógio de cada empresa é única, mas existem alguns temas comuns.

O alegado desenvolvimento de produto da Dropbox - espetáculo e inovação em desaceleração – chegou às 7:00 há cerca de um mês. (O que significa que se seguem as 8:00).

O Twitter – que já deu a volta ao relógio várias vezes – está a lidar com uma especial dimensão “Qual o futuro da sua empresa?” às 7:00.

Passei vários anos na Google a tentar que o YouTube passasse as 8:00. (Para o The Wall Street Journal o YouTube está sempre nas 8:00).

O Foursquare está preso nas 8:00 desde 2013.

A Square (a empresa onde trabalho) passou o seu tempo às 9:00 em meados de 2014. Às 9:00 tudo é percebido como uma má notícia, até mesmo as boas notícias. As tolices tornam-se um cânone. Você não consegue fazer nada bem.

As 10:00 são atormentadas por relatórios referentes à partida de executivos e “tumultos”. Torna-se mais difícil recrutar novos colaboradores, o que põe em risco a capacidade da sua empresa para crescer e conduzir uma conversa.

Tanto a Zynga como a Groupon passaram muito tempo às 10:00. Hoje, é a Reddit. Tendo já passado algum tempo às 8:00 as questões internas da equipa da Reddit estão agora a chegar à comunidade em geral.

E aqui surgem as questões de privacidade. As 11:00 são muito escuras.

O Facebook – apesar de não se encontrar lá agora – já foi o rei das 11:00.

Às 11:59 a crítica torna-se pessoal. Você vê muitas histórias de “[Boicote a [sua empresa]](http://gawker.com/boycott-uber-if-you-dont-like-it-1497095976)”. As pessoas questionam os seus motivos e imputam as suas decisões como maliciosas. Você é uma empresa má e com fome de dinheiro.

Hoje, a “pior empresa do mundo” é a Uber.

Construíram algo. Despedaçaram-no. E agora?

Toda a gente adora um retorno.

Hoje, pouco mais de um ano de mandato de Satya Nadella como CEO, a Microsoft passou a meia-noite. (A capa da Bloomberg Businessweek de 2012 sobre o Twitter, “a empresa que não morreria”, é a minha história de renascimento preferida de sempre).

Tal como no relógio, assim que você passa a meia-noite você começa de novo. Volta a ser amado, até que não, e depois o relógio (e esta analogia) desmoronam e a sua empresa pode dobrar o espaço-tempo da narrativa ao existir em muitos enredos positivos enegativos, simultaneamente.