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Singapura dá passos na simplificação administrativa entre entidades administrativas e entre estas e os cidadãos em geral

Mora em Singapura e depara-se com um animal na rua. A quem é que deve dar conta do sucedido?

Depende se o animal está vivo ou morto, se é doméstico ou selvagem. A ser uma ave, é um corvo? A combinação de respostas a estas perguntas vai determinar o número de contacto a utilizar.

O labirinto burocrático é tão denso que a maioria das pessoas desiste e acaba por telefonar “ao amigo”. Tirando que o amigo trabalha na esquadra e é polícia.

Para resolver isto, o governo de Singapura criou uma aplicação chamada OneService (UmServiço), que funciona basicamente como o centro de atendimento para qualquer questão envolvendo o município, e inclui áreas como controlo de pragas, limpeza, zonas arborizadas e projetos de construção.

A ocorrência é então reencaminhada para as entidades competentes, com as notas de seguimento a serem partilhadas na aplicação.

Parece simples. Então porque é que não se pensou nisto antes?

Chan Cheow Hoe, diretor de informática da Infocomm Development Agency of Singapore (IDA), está investido em descobrir a resposta desde que se juntou à empresa pública há dois anos.

E como o próprio diria, a estrutura do governo é um organismo complexo e sem igual, completamente diferente de tudo o que alguma vez encontrou numa carreira em torno de sistemas informáticos financeiros e comerciais.

“Consideremos o sistema das licenças, por exemplo. Porque é que não temos uma plataforma comum a todos os sistemas de licenciamento, que se ocupe de todas as licenças do governo? Claro que é possível, mas tem ideia da complexidade e sofisticação envolvidas para criar uma?

“E não se trata apenas de cinco entidades. Estamos a falar de qualquer coisa como 85 agências. Tentar criar um protocolo comum é de levar à loucura”, garante Chan.

O governo optou portanto por outra forma de integração, usando uma estrutura piramidal. Em vez de criar um Frankestein tecnológico capaz de gerir milhares de diretivas por parte de dúzias de entidades administrativas, porque não vincular os vários sistemas a um centro de triagem, com o qual o cidadão interage?

Isto significa que as bases de dados se mantêm separadas, alojadas no servidor de cada instituição. A informação circula entre o centro de triagem, em função do nível de envolvimento do utilizador, e a agência.

É o melhor de dois mundos: o utilizador interage com apenas uma interface e as entidades administrativas não tentam uma fusão impossível.

Esta premissa deu aso àquilo que Chan chama a “IPA global do Estado”* (Interface de Programação de Aplicações). Pense nisto como uma série de canais e portas que permitem a fácil e livre circulação de dados entre a administração central e o público.

Uma peça fundamental na IPA global é o “portal”. No fundo um sistema que protege e gere toda a informação em circulação.

O portal pode regular pedidos na IPA, incapacitar aplicações fraudulentas de extravio de dados e rastrear históricos de atividade. Tem ainda uma consola que permite aos administradores restringir o acesso a informação confidencial.

Há dois portais IPA: um privado para a partilha de dados entre entidades administrativas e um público para gerir a informação IPA acessível ao público, que pode visitar em Data.gov.sg. Estes dois portais são entidades separadas que não comunicam entre si.

Para além do OneService, há já outras aplicações disponíveis na IPA global.

Temos o MyInfo, que guarda os dados pessoais para poupar o utilizador de criar nova conta quando usa um outro serviço on-line.

E existe ainda o Business Grants Portal, uma plataforma que permite às empresas concorrer a subsídios em mais de 10 agências.

Num futuro próximo, estes serviços on-line serão desenvolvidos dentro da lógica plataforma-como-serviço (platform-as-a-service, PaaS), cuja infraestrutura já existe. “Há portanto, uma forma de criar estas plataformas sem ter de reinventar a roda constantemente,” constata Chan.

O novo Data.gov.sg

A administração central também tem preparado terreno com um novo Data.gov.sg, que reúne toda a informação recolhida pelas IPA disponíveis ao público.

A versão anterior era na verdade um cemitério de informação. Tinha 11.000 conjuntos de dados, na sua maioria PDF e CSV a terem de ser descarregados manualmente pelos utilizadores, limitando o potencial de utilização por parte de uma aplicação. Mais, porque a informação está alojada no próprio Data.gov.sg, as entidades esqueciam-se que estava disponível. A informação desatualizava-se e tornava-se obsoleta.

O novo site é um passo na direção da real partilha de informação. De 11.000 conjuntos de dados, mais de 500 dos mais populares foram limpos e carregados no novo site. O foco agora é a qualidade e a possibilidade de leitura pelas IPA. Esperam-se mais conjuntos de dados e IPA no futuro.

As entidades administrativas são agora responsáveis pela manutenção dos respetivos conjuntos de dados, que por sua vez são partilhados no Data.gov.sg. Os técnicos podem aceder ao guia que os orienta na extração da informação.

Margem para melhorias

A IPA global de Singapura é recente. Como tal, esperam-se meses, e até anos, até o país poder gozar plenamente os benefícios desta nova abordagem.

Para começar, há espaço para uma maior unidade e integração entre os diversos serviços. Se considerarmos que o SingPass é o único sistema de registo utilizado pelos cidadãos para aceder a variados serviços on-line, seria ideal o MyInfo ser melhor agregado ao SingPass.

Isto cria algo muito semelhante à simbiose Facebook-Google no que toca o acesso às contas de utlilizador, em que a informação pessoal é partilhada pelas várias aplicações. A ideia de uma “conta de utilizador de Singapura” já foi posta em cima da mesa.

Mais, enquanto Chan aspira a que o Data.gov.sg ajude a definir a “economia IPA”, pela qual a partilha de informação traz vantagens económicas em escala, parece que a taxa de apropriação da informação por parte de entidades comerciais é baixa por agora, apesar do aumento de recurso a dados oficiais por parte de meios de comunicação e difusão e programadores.

Pode ser que seja uma questão de tempo. As mentalidades não mudam do dia para a noite.

Antes eram os diretores que davam palpites e tomavam decisões sobre o aspeto de uma aplicação ou site, chegando mesmo a determinar cores e imagens.

A tomada de decisão baseada na recolha de dados veio, porém, mudar isso. São as necessidades e preferências do utilizador que prevalecem.

“Hoje em dia, em qualquer conferência, discute-se o volume de dados. Há todavia um problema subjacente: não é o volume de informação, ou as ferramentas, ou a infraestrutura,” diz Chan.

“O que realmente importa é fazer o público, os utilizadores, as empresas, começar a pensar em utilizar dados na resolução de problemas. E essa é uma mudança de mentalidade grande. Gigante.”

*Nota de tradução:

No artigo original utiliza-se a expressão “whole-government API”. Optou-se por uma tradução não literal que fizesse sentido a nível de conteúdo para o público português. Para referenciar o uso da expressão utiliza-se “IPA global” no resto do artigo.

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