Que se lixe o mundo das start-ups
Página principal Tecnologia

Parece que ultimamente só se fala de start-ups – e as mesmas estão por todo o lado. Conheça a opinião de Shem Magnezi, que colabora com o medium.com

Que se lixe a cena de ser empreendedor e os 30 minutos diários a ler a TechCrunch, TNW, Wired, Gizmodo, Mashable, The Verge e ProductHunt só para estar em cima do acontecimento. Que se lixem as conversas da treta tipo “Brutal! Já sabes da nova feature do Snapchat? ‘Tás a gozar? O Instagram a copiar o Snapchat? Viste aquele vídeo live to Zuck(erberg) em Roma? E viste o tweet do Elon Musk? A Uber conseguiu mais uma injeção de capital externo!”. Vão-se lixar. Ninguém quer saber.

Que se lixem os serões no escritório. Ninguém quer saber se Elon Musk trabalha mesmo 100 horas por semana ou se Marissa Mayer encaixa 130 horas de trabalho semanais enquanto amamenta os filhos recém-nascidos. Você não é nem Elon Musk nem Marissa Mayer – nem vai chegar ao espaço ou construir a próxima SpaceX. Faça-me o favor de desligar a porcaria do Mac e vá brincar com os seus filhos.

E que se lixe também a cultura dos “copos”. Deixe lá de celebrar tudo e mais alguma coisa com um whisky, imperial ou pizza e imperial. Tipo, toda a empresa que se preze agora tem de ter um bar? O vosso bar tem malte Glenlivet de 17 anos e não de 15. É precisamente o tipo de coisa que me faz sair da cama todos os dias.

Que se lixem os distúrbios alimentares. Porque diabo é que tem de ser tudo ao extremo? De um lado da balança tem o monstro das bolachas, pizzas e comida de pacote. Do outro tem o idiota adepto da “eficiência ao segundo” que só bebe batidos proteicos. A sério, mas que palhaçada é esta?

E que se lixem também todas as festas de angariação de fundos. Ainda não percebeu? Só está a cavar a própria sepultura. Devia era celebrar os dias em que não tem de esquartejar pela enésima vez, e vender, parte da sua empresa.

Que se lixem os escritórios open space – Acha mesmo que Zuck consegue planear o novo ano do Facebook enquanto a equipa se diverte com pistolas de água e afins? Vão-se lixar com as secretárias de pé, as bolas de alongamentos à laia de cadeiras e as secretárias com passadeira integrada. Nada disso o vai fazer recuperar das batatas fritas de pacote que despachou há bocado, por isso deixe-se de conversas e sente-se numa cadeira normal como uma pessoa normal.

Que se lixe a história de ler um livro por semana. Ninguém consegue ler assim tão rápido. Repito – NINGUÉM LÊ ASSIM TÃO RÁPIDO. E que tal ler mesmo o maldito livro?! Que se lixem as referências a Malcolm Gladwell e Dan Ariety – e deixe de citar A Startup Enxuta por amor da santa. Já toda a gente leu esse.

Que se lixem os “empreendedores”, palavra de honra – Toda a gente é empreendedora hoje em dia. Sobretudo todos os recém-licenciados cheios de ideias. Só para que saibam: chama-se “desemprego”. Que se lixem os espíritos inovadores que dispensam apoios financeiros. Que se lixe o trabalhar a partir de uma arrecadação e o escritório de 2,5m2. “Ao menos posso levar o cão para o escritório”. Vá-se lixar, a sério.

Que se lixem os viciados em produtividade. Fazem-me sentir estúpido por ter acordado tarde e a más horas às 6 da manhã. Quero lá saber se acordou às 4:30, meditou durante 30 minutos, reviu os objetivos do trimestre e emborcou um fantabulástico batido proteico enquanto dava uma vista de olhos nas estatísticas da empresa. Que se lixem os auscultadores silenciosos e os temporizadores para trabalho intervalado, que se lixem as agendas, as aplicações, as listas, notas e post its e sabe Deus que mais.

Vá-se lixar por me dizer que ver televisão é uma perda de tempo – mas que gosta de descontrair e adora o Netflix. Vocês veem todos as mesmas séries. Páre lá de dizer que é parecido com o Elliot de Mr. Robot porque até “curte” passar por geek. No seu caso, é mesmo só um robot, o que é bem diferente. Continue a rir-se com o quão real Silicon Valley da HBO é, em vez de perguntar porquê. E páre de me aconselhar a perguntar sempre o “porquê”.

Que se lixem as perguntas parvas de entrevistas. Mas quem é que se lembra dessas perguntas parvas? Nunca tive de saber programar à séria! Os quadros brancos não dão erros de indexação. Quando preciso de um hash set em Java, uso o HashSet – quero lá saber o quão complexo é o programa quando posso comprar mais cloud storage. Quero que você se lixe.

Que se lixem os termos técnicos e as siglas. Os DAU (daily active users – utilizadores ativos por dia), MAU (monthly active users – utilizadores ativos por mês), ARPU (average revenue per user – receita média por utilizador), LTV (loan to value – quociente empréstimo-valor), CPM (cost per mille – custo por milhar), CPI (consumer price index – índice de preços ao consumidor), CPC (cost per click – custo por clique), CTR (click through rate – número de cliques), SEO (search engine optimization – otimização para motores de busca), YoY (year over year – ano sobre ano) e WoW (week over week – semana sobre semana). Que se lixem todos. Mas quem é que se lembra de andar em cima disto? Isso e eventos de networking. Todos os presentes são CEO de qualquer coisa e estão todos a planear ultrapassar sabe Deus quem em sabe Deus que mercado para poder crescer exponencialmente.

Que se lixe a mania da transparência, as autópsias e os 5 porquês. Só vos falta trazerem isso na testa. Vão-se lixar mais o Design Sprint em todas as ocasiões, o esticar a equipa de produção 100 vezes por dia, ignorar da fase de teste e apostar na arquitetura modular. Que se lixem as novas características do site e a quantidade interminável de variantes. Gostava de poder contar com a mesma versão sempre que acedo por isso parem de o mudar de acordo com as minhas preferências.

Que se lixem as start-ups adeptas de grandes festas e eventos surreais em locais demasiado caros. Contratem antes uma equipa de catering! Que se lixe o gastar dinheiro em mesas de ping pong que nunca ninguém usa, em espaços de música e de sesta, locais de meditação ou stress free e salas para pilates. Que se lixem também os incentivos estúpidos. Que se lixe a política de férias ilimitadas – é treta. Toda a gente sabe que os vossos colaboradores não as vão utilizar.

Mais que tudo, start-ups, vão-se lixar por me tornarem parte do vosso mundo.

Fonte: Medium

Por favor, descreva o erro
Fechar